Reflexão sobre o Lançamento do SBT News: O Encontro de Poderes e a Crise da Imparcialidade
O lançamento do canal de jornalismo SBT News, em Osasco, Grande São Paulo, na última sexta-feira, transformou-se em um evento político de alta tensão, gerando intensas reações nas redes sociais e levantando profundas questões sobre a relação entre o Judiciário, o Executivo e os veículos de comunicação no Brasil. A presença de autoridades de diferentes espectros políticos, incluindo o Presidente Lula, o Vice-presidente Geraldo Alckmin, o Governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, o Prefeito Ricardo Nunes, e, notavelmente, o Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, colocou o novo canal no centro de uma polêmica nacional.
O Abraço Institucional e a Sanção Magnitsky
Um dos momentos mais destacados e criticados do evento foi o discurso do Ministro Alexandre de Moraes, que expressou publicamente sua gratidão ao Presidente Lula pelo "empenho" em retirá-lo das sanções da Lei Magnitsky. Moraes afirmou que acreditava que a verdade prevaleceria ao chegar às autoridades norte-americanas. Em resposta, o Presidente Lula confirmou que havia conversado com o ex-presidente americano Donald Trump, que reconheceu a injustiça de punir um Ministro da Suprema Corte Brasileira por estar cumprindo a Constituição. Lula enquadrou a situação como uma vitória para o Brasil e para a democracia brasileira.
Moraes aproveitou a ocasião para abordar a manipulação de conteúdo, afirmando que grupos econômicos, big techs, algoritmos direcionados e "notícias fraudulentas" (algumas trabalhadas por inteligência artificial) têm operado por pelo menos 20 anos no Brasil e no mundo, impactando a população.
Apesar do tom institucional, analistas criticaram a natureza do encontro, questionando a presença de um Ministro do STF em um palco de lançamento de um canal de jornalismo. O Ministro foi rotulado por alguns comentaristas como um "ativista" ou "político", cujo discurso no evento era essencialmente político. Tais imagens foram consideradas "vergonhosas" por serem vistas como o "sistema todo junto". É importante notar que Moraes, no passado, já proferiu decisões judiciais favoráveis ao SBT, inclusive livrando a emissora de uma indenização de R$ 4 milhões em um litígio com a apresentadora Raquel Sherazad.
A Repercussão e a Divisão Social
O evento provocou reações imediatas e drásticas. A repercussão nas redes sociais foi notável, levando a apresentadora Patrícia Abravanel, uma das filhas de Silvio Santos, a perder milhares de seguidores no Instagram.
O cantor sertanejo Zezé Di Camargo, que é visto como representante do agronegócio e do "povo brasileiro", usou suas redes sociais para anunciar a intenção de romper com o SBT. Ele criticou as filhas de Silvio Santos por pensarem "totalmente diferente do que o pai pensava", alegando que "filho que não honra pai e mãe para mim não existe". Zezé Di Camargo afirmou que estava falando em nome do Brasil e que não fazia parte do "sistema" organizado naquele palanque político, dando um exemplo que, segundo um comentarista, os políticos da oposição deveriam seguir.
A oposição, representada pelo senador Flávio Bolsonaro, classificou o evento como um "show de horrores", acusando os presentes de, a título de defender a democracia, terem acabado com seus pilares, como a liberdade de expressão e a independência entre os poderes. Ele afirmou que aquelas pessoas perseguem inocentes, agem fora da lei e "blindam bandidos".
Em meio a essa polarização, a Primeira Dama Janja da Silva criticou Zezé Di Camargo, destacando que seus comentários sobre as filhas de Silvio Santos refletem "todo o machismo e a misoginia" presentes no pensamento de homens que desrespeitam a presença de mulheres em espaços de poder.
Imparcialidade em Xeque
Diante da enxurrada de críticas, a presidente do SBT, Daniela Beyruti, divulgou uma carta aberta reafirmando o foco do novo canal na imparcialidade e isenção, garantindo um jornalismo sem partido, sem viés e sem provocação.
Contudo, a reflexão que permanece é sobre o que o evento simboliza. Silvio Santos, pai das atuais gestoras, mantinha a política de nunca desagradar ao governo, fosse qual fosse o poder vigente. O encontro no lançamento do SBT News, com o endosso explícito de figuras do Executivo e do Judiciário, levou os críticos a interpretarem o cenário como uma "suruba institucional", onde os pilares de uma democracia (como a independência de poderes) parecem se misturar em um palanque único.
O caso levanta a questão de como um veículo de comunicação pode prometer isenção e credibilidade quando seu lançamento se torna um palco para demonstrações de alinhamento político e gratidão institucional entre os poderes. A reação pública demonstra que a linha entre a cobertura jornalística e o endosso político é tênue e facilmente rompida, especialmente em um cenário de alta polarização, onde a imprensa é esperada para ser, acima de tudo, um fiscal dos que estão no poder.