Reflexão: O Rigor Chinês e o Desafio da Impunidade no Sistema de Justiça
O recente episódio da condenação de um ex-ministro da Agricultura na China à pena de morte por corrupção, envolvendo uma fraude de aproximadamente R$ 220 milhões de reais num período de 17 anos, levanta um debate crucial sobre a eficácia da justiça criminal e o efeito pedagógico da punição. A notícia, discutida no Jornal Gente, serve como um ponto de partida para contrastar a severidade do sistema legal chinês com as complexidades e a percepção de impunidade frequentemente associadas ao contexto brasileiro.
O Poder da Punição Rigorosa e o Efeito Pedagógico
A China aplicou a condenação máxima contra um indivíduo extremamente poderoso e influente, que serviu como ministro da agricultura de 2020 a 2024 em um país que mais importa alimentos no mundo. Enquanto no Brasil tal quantia poderia ser considerada uma "merreca" por "vários dos nossos bandidos, alguns deles eleitos", lá, ela foi suficiente para a pena de morte.
O principal ponto de destaque dessa notícia é o efeito pedagógico que o rigor da lei impõe. A experiência na China sugere que a aplicação rigorosa e certa da legislação penal, punindo os criminosos com o máximo rigor da lei por todos os crimes, modula o comportamento da sociedade. Historicamente, a severidade na aplicação da lei fez com que crimes como assaltos em motos (comuns no Brasil) se tornassem raros na China, pois o sistema funciona e as pessoas temem a punição, mesmo por subtrações simples, como o caso de um livro esquecido em um restaurante.
A leniência com o crime, do menor ao maior, é vista como um estímulo para que todos os crimes sejam cometidos. Citando a teoria das janelas quebradas (aplicada em Nova York por Rudolph Giuliani), argumenta-se que a punição de todas as infrações e a manutenção da ordem estimulam as pessoas a mudar seu comportamento para preservar a qualidade do lugar.
A Fragilidade do Sistema Jurídico Brasileiro
O debate inevitavelmente se volta para o Brasil, onde o Judiciário é apontado como "o maior problema" devido à absurda instabilidade das normas jurídicas e interpretações que mudam constantemente.
Grandes operações de combate ao crime e corrupção, como a Satiagraha, a Banestado e a própria Lava Jato, são frequentemente anuladas por "filigranas jurídicas" que não seriam consideradas em nenhum país civilizado que os brasileiros adoram usar como modelo. O sistema jurídico brasileiro é criticado por ter se tornado uma entidade que se autoserve e se autointerpreta, criando "princípios com os nomes mais trêloucados possíveis" para anular operações criminais, mesmo quando há confissões e devolução de milhões de reais.
Essa situação gera uma sensação de impunidade gigante. Se os líderes no Planalto encontram desculpas para a corrupção e não cumprem as leis, a "planície não se sentiria incentivada a cometer um crime?". Além disso, a justiça brasileira lida com a mentira em juízo de forma branda, reconhecendo apenas o crime de falso testemunho (aplicável à testemunha, não ao acusado), diferentemente do sistema penal norte-americano, que possui o crime de perjúrio, responsabilizando a parte se ela optar por falar.
A reflexão conclui que a falta de punição e a atuação de juízes que não compreendem a realidade de perigo no Brasil, que veem o criminoso (mesmo o que atira em pais de família) como vítima da sociedade, empoderam a vagabundagem, enquanto os cidadãos de bem vivem presos em casas com grades.
A Discussão sobre a Pena Capital e Prisão Perpétua
A condenação chinesa reacende a antiga discussão sobre a pena de morte. O professor Emanuel Pessoa manifesta sua posição pessoal, fundamentada na moralidade cristã, sendo contra a pena de morte. Sua principal ressalva é a perda da oportunidade de arrependimento (referindo-se à parábola bíblica do bom ladrão) e o risco de erros judiciais, observados em países como os Estados Unidos, onde pessoas são absolvidas após décadas no corredor da morte.
Em vez da pena capital, o professor defende a prisão perpétua, especialmente para corruptos. No entanto, ele aceita que a pena de morte possa ter efeitos pedagógicos e, vivendo em sociedade democrática, ele aceitaria se a maioria da sociedade assim decidisse.
É importante notar que, no sistema chinês, a pena de morte nem sempre é executada de imediato. A maioria dessas penas possui suspensão condicional por dois anos. Se o condenado demonstrar bom comportamento na prisão, a pena é comutada para prisão perpétua. Se o bom comportamento e o arrependimento persistirem, pode haver comutação para décadas de prisão.
Conclusão: O Incentivo à Virtude
A essência da reflexão reside na ideia de que não se deve esperar "escolher as pessoas certas para tudo na vida", mas sim "criar o incentivo para que as pessoas erradas façam as coisas certas".
O incentivo, do ponto de vista da justiça criminal, é a punição rápida, certeira e pesada. Isso não significa injustiça – a ampla defesa e o contraditório devem ser mantidos – mas os processos não devem se arrastar por inúmeras instâncias apenas porque o corrupto pode pagar advogados caríssimos e fazer conexões políticas em Brasília. Uma justiça que precisa criar princípios incompreensíveis para o cidadão comum não é justa.
O Brasil precisa absorver, do exemplo chinês (e não necessariamente adotar a pena de morte), a força da justiça criminal para coibir crimes por meio do exemplo, pois a leniência com a corrupção e a criminalidade destrói o modelo de comportamento para toda a sociedade.