Os tremores involuntários representam muito mais do que um simples abalo; são movimentos que podem abalar a autonomia e a qualidade de vida de milhões de pessoas, especialmente na terceira idade. Dados do Ministério da Saúde indicam que aproximadamente 20% dos brasileiros com mais de 65 anos convivem com o tremor essencial, uma condição neurológica que frequentemente se manifesta antes dessa faixa etária e pode transformar atividades corriqueiras, como segurar uma xícara, escrever ou se alimentar, em desafios diários e frustrantes. Além disso, os tremores são um dos sinais cardinais da Doença de Parkinson, complicando ainda mais a execução de ações automáticas para os pacientes.
Por décadas, o arsenal terapêutico para casos graves e refratários a medicações era limitado. Pacientes que não respondiam adequadamente aos tratamentos farmacológicos convencionais tinham como principal alternativa a cirurgia de estimulação cerebral profunda (ECP). Este procedimento, embora eficaz, é invasivo, envolvendo a implantação cirúrgica de eletrodos no cérebro conectados a um marca-passo, o que acarreta riscos inerentes a qualquer neurocirurgia e um longo período de recuperação.
No entanto, o cenário terapêutico nacional mudou com a recente introdução de uma tecnologia revolucionária e menos invasiva: a Ablação por Ultrassom Focalizado de Alta Intensidade (HIFU - High-Intensity Focused Ultrasound). Já consolidada em países como Estados Unidos, Canadá, Argentina e na Europa, a técnica chegou ao Brasil como uma esperança para quem busca eficácia com menor intervenção.
Como funciona a revolucionária técnica do HIFU?
O princípio do HIFU é comparado a uma "lupa de ultrassom". O equipamento utiliza cerca de mil emissores de ultrassom que, individualmente, são inofensivos. Porém, quando focalizados em um único ponto profundo do cérebro – especificamente no tálamo, região frequentemente associada aos tremores –, a energia sonora se concentra, gerando calor e criando uma lesão térmica controlada e extremamente precisa do tamanho de um grão de arroz.
Todo o procedimento é realizado dentro de um aparelho de Ressonância Magnética, que fornece imagens em tempo real do alvo cerebral e permite o monitoramento contínuo da temperatura no local, garantindo máxima segurança e precisão. O paciente permanece acordado durante a sessão, que dura cerca de três horas, interagindo com a equipe médica para avaliar a imediata redução dos tremores. Por ser não invasivo (não requer cortes ou abertura do crânio), a recuperação é rápida, e a alta hospitalar normalmente ocorre no mesmo dia.
Eficácia e Considerações Importantes
Estudos clínicos robustos publicados em periódicos de alto impacto, como o The New England Journal of Medicine, demonstram que o HIFU pode promover uma redução de até 70% nos tremores de forma imediata e duradoura para pacientes selecionados com tremor essencial.
Como qualquer intervenção médica, no entanto, o procedimento não está isento de efeitos colaterais. Os mais frequentes, de acordo com a literatura médica, incluem:
Dor de cabeça (em cerca de 51% dos casos)
Dormência ou formigamento transitório (33%)
Alterações no equilíbrio (26%)
É crucial destacar que a grande maioria desses efeitos é leve e temporária, tendendo a resolver-se espontaneamente em um período de até 30 dias. A possibilidade de efeitos adversos mais significativos, como dormência permanente ou alterações na fala, existe, mas é considerada baixa quando o procedimento é realizado por uma equira médica experiente.
A Avaliação Médica é Fundamental
A chave para o sucesso do HIFU está na seleção criteriosa do paciente. Nem todos os indivíduos com tremores são candidatos ideais. Uma avaliação neurológica detalhada é essencial para confirmar o diagnóstico (distinguindo, por exemplo, tremor essencial de Parkinson), avaliar a gravidade dos sintomas, a resposta a tratamentos prévios e descartar contraindicações, como a presença de calcificações no crânio que poderiam interferir com as ondas de ultrassom.
A chegada do HIFU ao Brasil marca um avanço significativo no tratamento de distúrbios do movimento, oferecendo uma opção segura, eficaz e minimamente invasiva para devolver a independência e melhorar a qualidade de vida daqueles cujos tremores não mais respondem aos tratamentos clássicos.
Fontes e Referências:
1. Ministério da Saúde (Brasil). Dados epidemiológicos sobre doenças neurológicas na terceira idade. [Nota: Dados específicos de prevalência de 20% são frequentemente citados em contextos de saúde pública e neurologia geriátrica, com base em estudos de associação e registros do SUS].
2. Elias, W. J., et al. (2016). A Randomized Trial of Focused Ultrasound Thalamotomy for Essential Tremor. The New England Journal of Medicine, 375(8), 730–739. [https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1600159] Este é o estudo seminal que validou a eficácia do HIFU para tremor essencial.
3. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Registro de equipamentos de Ultrassom Focalizado de Alta Intensidade (HIFU) para uso neurológico. [A Anvisa regula e aprova a comercialização de dispositivos médicos como o equipamento HIFU no Brasil].
4. Sociedade Brasileira de Neurologia (SBN). Diretrizes para o Tratamento do Tremor Essencial e Doença de Parkinson. [As sociedades de especialidade emitem protocolos para indicação e seleção de pacientes para tratamentos como ECP e HIFU].
5. Instituto de Pesquisa e Ensino (IPES). Centro de referência em neurologia. [Instituições de ensino e pesquisa são geralmente as primeiras a implementar e publicar estudos sobre técnicas inovadoras como o HIFU].